Contact Us

Use the form on the right to contact us.

You can edit the text in this area, and change where the contact form on the right submits to, by entering edit mode using the modes on the bottom right. 

         

123 Street Avenue, City Town, 99999

(123) 555-6789

email@address.com

 

You can set your address, phone number, email and site description in the settings tab.
Link to read me page with more information.

Snack-bar

Poemas de agora

Snack-bar

Maria S. Mendes

 

Snack-bar

 

Batem fotografias ao balcão

e a miúda da novela

por ter o filho

o bar a fechar

e a miúda por ter a criança

 

há uma máquina de imagens

linguagem aligeirada

que trata destas coisas

e não falha nunca

 

ou um livro sobre a mesa

aberto na página seguinte

à do café de ontem

também isto nunca falha

 

o tempo é todo

 

e o vento fecha-nos entre paredes

os barcos não saem

ninguém na lota

 

pomo-nos a imaginar

saídas para o amor

o tempo é todo                                                                                                                  

e a vida por acabar

 

e qualquer coisa ali à direita do verbo

e não sabemos colocá-la onde?

 

pomo-nos a olhar uns nos outros

e sorrimos

 

e terrível deter a miúda

que gosta do beijo no banco de trás

 

ela o diz

e que o tempo é todo

 

e que nada falha

e que a pose ao balcão

é uma saída para o amor

ou uma imagem

apenas uma boa imagem

 

e voltamos ao livro

e tanta coisa

tanta coisa mais por jogar

num pedaço de papel

e qualquer coisa na mesa do lado

e não o sabemos.

 

Hugo Milhanas Machado, “Snack-bar”, Clave do Mundo. Lisboa: Sombra do Amor Edições, 2007. 

@ Hugo Milhanas Machado. Aqui publicado com autorização do autor. 

 

Gosto deste poema porque encontro nele uma distracção atenta, que adensa um impasse entre interrupção e sucessão, através de imagens instantâneas que um olhar curioso vai recolhendo e sobrepondo.

Um snack-bar acolhe pessoas que se refugiam do vento numa zona piscatória e o olhar curioso do poeta entretém-sea “imaginar/ saídas para o amor”, retendo vários instantes do cenário onde se encontra e adiando o momento em que se fixará em algum deles – as fotografias que se tiram ao balcão, o bar a fechar, a miúda da novela que passa na televisão, o livro por ler sobre a mesa, a hesitação da escrita, o olhar uns nos outros, a vida desconhecida na mesa do lado. Creio que esta estratégia permite, simultaneamente, desdobrar o espaço da cena que encerra o texto e reverberar o tempo suspenso deste episódio.

Este duplo efeito de tempo (cronológico e meteorológico), que parece interromper o funcionamento da vida (“o tempo é todo/ e a vida por acabar”), enclausurando-a no espaço (“o tempo é todo/ e o vento fecha-nos entre paredes”), é confrontado com outros expedientes que, segundo o poeta, nunca falham, talvez por franquearem o acesso a novas realidades: “a[s] máquina[s] de imagens” (fotográfica e televisiva) e “o livro aberto sobre a mesa”. No entanto, nenhuma destas “saídas” sucessivas, que incluem imagens (“e que a pose ao balcão/ é uma saída para o amor/ ou uma imagem/apenas uma boa imagem”) e coisas (“e voltamos ao livro/ e tanta coisa/ tanta coisa mais por jogar/ num pedaço de papel/ e qualquer coisa na mesa do lado”), atrai a exclusividade do olhar demorado do poeta, gravitando entre todas elas, consciente do desconhecido que cada uma oferece (“e qualquer coisa na mesa do lado/ e não o sabemos”).

Apesar de o discurso do poeta decorrer na primeira pessoa do plural –  a única voz do grupo que o vento encerra no snack-bar – existe uma tentativa de singularização de outro protagonista, através de duas referências a uma “miúda” (“a miúda da novela/ por ter o filho”; “é terrível deter a miúda/ que gosta do beijo no banco de trás/ ela o diz”). Ela surge como uma fugaz expressão de desejo no feminino, resgatada da “máquina de imagens” para o texto, que o poeta vai construindo ao ritmo do impasse: “e qualquer coisa ali à direita do verbo/ e não sabemos colocá-la onde?”

Sara Campino


Sara Campino divide-se entre o trabalho em arquitectura e a investigação em literatura. Descobriu a sua paixão pela poesia quando reparou que guardava certos poemas na memória à espera de conseguir compreendê-los.